quinta-feira, 8 de setembro de 2016

AÇOUGUEIRO LAURO


Na rua em que eu morei, quando criança, tinha um pequeno açougue, era um compartimento rudimentar, insalubre, havia um toco enorme na calçada daquele estabelecimento comercial, e todos os dias, exatamente às 11 horas da manhã, seu Lauro punha a bandeira vermelha para avisar as donas de casa que a carne já tinha chegado do frigorífico de Fortaleza, o FRIFOR.
Seu Lauro era um magarefe remanescente dos matadouros de Antônio Bezerra. Um caboclo feio e desassombrado, que não tinha medo de ninguém, usava sempre uma bermuda branca, puída, e até suja. Quando me lembro do seu Lauro, de faca na mão, falando alto para Deus e o mundo ouvir, acho que ele era daquele jeito, que se portava de modo tão grotesco, áspero, penso que era em reparo do nome que se lhe deram. Eu conheci um Sâmio, no curso primário, que, quando menino, era valente, só vivia insultando comigo, mas depois de rapazola, virou gay. Visto isto, voltemos ao Lauro: Todos os dias eu ia comprar carne moída no açougue do seu Lauro, eu morria de medo daquele sujeito horroroso, de faca em punho, mas havia uma referência entre mim e aquele magarefe embrutecido pela profissão. Lauro conhecia o meu pai, e por isso mesmo evitava o mais que possível amedrontar-me com sua manopla e seus palavrões na cara dos fregueses. Ele pegava leve comigo, um dia adentrei o açougue, ele tinha saído, e alguém avisou que tinha freguês, e então ele veio e, num muxoxo, exclamou: Ah, é o filho do Zé-maria... Você pode esperar, fique quieto aí. E começou a despachar, começando pelos mais velhos. Eu era da altura do balcão ( era uma geladeira), fiquei cavucando com a mão por ali e tomei um grande choque. Aí seu Lauro, que estava a amolar as facas, parou de supetão e gritou: Tá doido, diabo?

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